II


Sem o suporte do olhos, abrindo a boca como um pássaro, gemendo coisas em línguas, sim. Relâmpago lento em cavalos de lã. E começava a babar uns nomes, misturar pessoas em quiasmas caprichosos, o tempo voltando - a casavelha onde passarávamos as tardes, lembra? As paredes apodrecendo, trabalhadas pelas mãos frias da visita indesejada. No colo, o jornal espetava os acontecimentos como insetos. Era próprio das notícias serem póstumas, o que te incomodava. Você pegava os rola-bostas num pequeno guardanapo e devolvia-os pra bosta, onde podiam trabalhar e amar. E até um coisinho dum formigo era um passarinho pra você.
Escrevo daqui. Sem as batatas que só você. Com um amor mudo, bruto, inconfessado. Todo teu. E ainda não sei o nome de muitas coisas, então eu descrevo pra você usando uma imitação das coisas. Porque, sabe, não sei senão contar. E contar é meu modo de ficar em silêncio - ando sem sair de mim. Mariposas no lugar dos olhos. Eu sei que você não pode ouvir. Mas tudo é tão pouco que possível me parece belo. E possível sempre é, mesmo que não seja. Existe sempre o velho recurso ao sonho: e daí ele acordou e descobriu que sonhara. E porque não começar assim?

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